Já ouvi algumas vezes frases como: “Meu tio, cunhado, avô, colega de serviço, insira-aqui-a-pessoa-que-quiser provou minha cerveja, gostou e quer investir num negócio pra gente vender cerveja caseira”.
Por incrível que pareça, esses são comentários muito comuns: quando você vai vender? Encontro pra comprar em algum lugar? Qual o preço por garrafa? Você faz em barril para festas?
Só que arrisco dizer a vocês que não é seguro pensar a respeito e vou explicar os porquês.
O primeiro motivo é burocrático
O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA para os íntimos) regulamenta o mercado de bebidas no Brasil e para conseguir o alvará de cervejaria não é fácil.
Eu já fui proprietário de bar e na ocasião o plano original era que fosse um brewpub. Porém, quando comecei a ver a quantidade de requerimentos, desisti da ideia.
Precisamos de alvará dos bombeiros, da companhia elétrica, de saneamento e por aí vai. Quando lidamos com alimentos, o Brasil é um dos países mais rigorosos e quando se trata de bebida alcoólica a coisa triplica.
Não é só o fato de ser saudável ou não, é também o fator vício e o risco causado no trânsito. Diversos fatores que tornam a produção extremamente controlada aos olhos do Governo.
Junte aí o fato das grandes cervejarias darem um “incentivo” pros pequenos não começarem e você tem uma tonelada de papéis formando uma barreira burocrática que, pra quem quer agir dentro da lei, terá que escalar degrau por degrau, laudo por laudo.
O outro motivo diz respeito à saúde
Reitero que o Brasil é um dos países mais rigorosos com a produção de alimentos. Quem já teve qualquer estabelecimento com uma cozinha ou já viu a série do Érick Jacquin vai saber do que falo.
E quem faz cerveja ou conhece o processo de fabricação sabe como a produção está exposta à contaminação.
Agora imagine um cenário hipotético em que quem acabou de começar a fazer cerveja ainda não tem experiência de produção ou sensorial para identificar alguns defeitos da cerveja.
Aquela insira-aqui-a-pessoa-que-quiser (que também não é sommelier, tá acostumada a tomar cervejas que descem redondo, então qualquer bebida um pouco diferente já é exótica o bastante) prova a cerveja e também não nota os defeitos, mas gosta do que bebeu e começa a dar o incentivo.
Então o cervejeiro inexperiente faz uma produção maior, leva até a feira do bairro e começa a vender garrafas. Na semana seguinte temos uma comunidade passando mal por intoxicação alimentar. Sentiu o peso da responsabilidade?
Decisão muito bem pensada
Fazer cerveja em casa é muito legal. Dá um trabalho danado, mas é gratificante. Porém, minha sugestão é que encarem como um hobby.
Montar um negócio pra vender cerveja caseira não é tão simples quanto parece, existem muitos obstáculos legais e eles não existem à toa.
Antes de cogitar essa ideia, tenha a certeza que é isso o que você quer. E como última barreira, no Brasil não é simples ganhar dinheiro com cerveja. Conheço vários donos de microcervejarias e digo: nenhum deles ficou rico com isso.
Por fim, lembrem-se amiguinhos: com grandes fermentadores vem grandes responsabilidades.