Criada no Rio de Janeiro em 2014, a cervejaria Hocus Pocus é focada em surpreender e testar os limites do que pode ser feito com cerveja. Considerada como uma das melhores e mais conceituadas cervejarias artesanais do país, vários de seus rótulos são líderes no Untappd (rede social de avaliação de cervejas). Suas receitas, trazem cervejas com grande qualidade técnica, criatividade e inovação, sem contar nas belas artes psicodélicas que ilustram os rótulos.
Nesta edição conversamos com o sócio-fundador da Hocus Pocus, Pedro Butelli, que nos conta tudo sobre a cervejaria, suas inspirações e a criação de suas poções mágicas, capazes de encantar qualquer um.
Cerveja de Todos os Jeitos: Pedro, obrigado por estar conosco nesta edição. Com primeira pergunta, queremos saber como surgiu a Hocus Pocus.
Pedro Butelli: A Hocus Pocus foi criada há 4 anos, em setembro de 2014. Eu e o Vinicius nos conhecemos em um curso de cerveja artesanal que fizemos com amigos em comum e, a partir daí, mergulhamos num vício de fazer no mínimo uma cerveja por fim de semana, sempre estudando como melhorá-las, pesquisando a causa de qualquer defeito que aparecesse ou que pudesse aparecer, trocando artigos sobre fermentação e lupulagem, estudando a química envolvida na fabricação de cervejas, inventando processos novos, etc. Tudo isso foi feito sem a pretensão de ter uma cervejaria, que ainda era uma coisa muito distante da nossa realidade, mas depois de um tempo ficamos com aquela dúvida: será que mais gente além da nossa família e amigos realmente gostaria de beber essas cervejas que estamos criando? A partir daí fizemos uma leva como ciganos e não conseguimos parar mais.
Cerveja de Todos os Jeitos: O nome, acredito, é uma curiosidade de muitos fãs da Hocus Pocus. Como nasceu esse nome?
Pedro Butelli: Ele surgiu como uma junção de várias ideias que representavam a forma que a gente faz cerveja. Hocus Pocus é um encantamento usado por mágicos da Idade Média no momento em que criavam seus feitiços. Isso se liga à metade mais subjetiva, menos racional de se fazer cerveja, relacionada à inspiração que às vezes vem de algum lugar que não conhecemos ainda. Hocus Pocus também é o nome de uma música que gostamos muito, de uma banda chamada Focus, de rock progressivo, um estilo que se encaixa muito com a nossa forma de fazer cerveja: ele usa como base o rock psicodélico em um movimento para reaproximá-lo de uma forma de arte, e não só de um produto para consumo; o propósito maior era dado à qualidade do conteúdo musical, das letras e arranjos, da criação e composição em estúdio, ao invés de focar mais na performance durante os shows; a originalidade e liberdade criativa dos músicos era muito valorizada, e eles assumiam alguns riscos na criação de algo que pudesse trazer valor ao mundo e evoluir a arte que escolheram se dedicar. Isso podia colocar algumas limitações no tamanho e no alcance desses músicos, mas o foco maior era na arte, mesmo. Durante as nossas brassagens ouvindo essas músicas, fomos notando valores parecidos e, quando decidimos que gostaríamos de ter uma cervejaria e já ficaríamos 100% satisfeitos só conseguindo sobreviver disso, achamos que o nome acabou nos escolhendo.
Cerveja de Todos os Jeitos: Hoje, após 4 anos de trajetória, qual é o conceito que a marca construiu e quer seguir?
Pedro Butelli: Começamos a cervejaria Hocus Pocus de um jeito bem orgânico, querendo criar as cervejas que nós gostaríamos que existissem e que possivelmente mais gente gostasse também. Somos apaixonados pela cerveja, não só o líquido em si mas tudo que a envolve, como o visual e a história por trás dos rótulos, a experiência nos eventos e bares em que elas são servidas e as sensações que as pessoas têm quando bebem, veem ou se relacionam de qualquer outra forma com ela. Por isso, nossa ideia é manter a Hocus Pocus como um lugar em que nós possamos focar em evoluir a cerveja, criando coisas que nós vemos valor e que, por estarmos tão mergulhados nisso e dedicando nossas vidas a isso, possa ter valor para outras pessoas também. Isso é bem arriscado porque faz o caminho contrário do que outras empresas às vezes fazem, que é olhar pro que o público pede e tentar entregar aquilo. A princípio nada garantia que nossas cervejas seriam comercialmente viáveis para manter uma cervejaria funcionando, mas até hoje tem funcionado e não poderíamos agradecer o suficiente por isso.
Cerveja de Todos os Jeitos: Quais são as suas inspirações para fazer cerveja? Há alguma cervejaria em que se espelham do Brasil ou de fora?
Pedro Butelli: Existem várias cervejarias que admiramos, tanto algumas de amigos nossos aqui no Brasil, onde o mercado evoluiu bastante nesses últimos anos, quanto lá fora, onde descobrimos algumas cervejas que mudaram nossa percepção do que é possível se fazer nessa área. Hoje em dia nossa inspiração vem mais de fora do mundo da cerveja e de outras experiências pessoais que temos, vendo algumas combinações de aromas e sabores que funcionem bem e referências estéticas que combinem com a nossa personalidade e com o momento de vida que estamos.
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Cerveja de Todos os Jeitos: Como nasce uma nova receita da Hocus Pocus?
Pedro Butelli: Às vezes vem de alguma combinação de ingredientes que vimos que pode funcionar (tipo uma combinação de lúpulos, de frutas, ou uma harmonização de qualquer outra coisa), ou da vontade de criarmos uma cerveja de um certo estilo que achamos que possa se aproximar um pouco mais do nosso gosto. A Magic Trap surgiu da nossa vontade de criar uma belga com alguns ajustes que achávamos importantes para o nosso gosto, como deixar ela mais seca, mais frutada, etc. A Rabbit Hole veio de experimentos combinando ingredientes que funcionariam em uma sobremesa à base de chocolate. Vamos lançar em breve uma Imperial Stout com banana, que surgiu de experimentos com harmonização de frutas e chocolate amargo. No fim, acho que a gente sempre acaba pensando na cerveja que gostaríamos de beber e corremos atrás para transformar essa ideia em cerveja.
Cerveja de Todos os Jeitos: E quanto às ilustrações dos rótulos, como é o processo criativo? Quais suas inspirações?
Pedro Butelli: Todos os rótulos têm uma história que ajuda a esclarecer um pouco do que queremos criar com a Hocus Pocus ou demonstra algum valor nosso ou parte da nossa personalidade. As primeiras lupuladas que lançamos (APA Cadabra, Interstellar, Event Horizon, Overdrive e Supersymmetry) fazem parte de uma mesma narrativa, por exemplo. Todas as Stouts também têm um tema específico, assim como nossas Berliners, inspiradas na estética 8-bits, tudo interligado de alguma forma.
Normalmente eu imagino onde a cerveja se encaixa na Hocus Pocus, a sensação que queremos passar com ela, e começo a criar uma imagem que a represente. A partir daí procuro um artista que tenha um traço que combine com o que foi imaginado e que consiga trazer essa imagem para a realidade da melhor forma possível. Isso acaba nos fazendo buscar artistas bem diferentes entre si, dado que as cervejas também variam muito.
Cerveja de Todos os Jeitos: Vocês possuem um bom portfólio de receitas? Quantas são ao todo e qual é a mais pedida, aquela que ganhou o coração dos apreciadores?
Pedro Butelli: Fizemos 25 cervejas que foram lançadas, e mais de 80 experimentos que fazemos semanalmente e não foram para o mercado ainda. A Orange Sunshine é uma blonde com laranja bem leve e refrescante que fizemos recentemente e que as pessoas estão gostando bastante. A Overdrive, Supersymmetry e Rabbit Hole costumam ser as mais elogiadas, mas acho que a mais famosa acaba sendo a Overdrive mesmo, pelo fato de ser a 1ª cerveja do estilo no Brasil e por ser a 1ª do ranking brasileiro no Untappd.
Cerveja de Todos os Jeitos: Com várias de suas cervejas em latas, recentemente vocês também participaram de um evento, em parceria com o Vá de Lata e a Ball, maior fabricante e latas do mundo, em prol do movimento de cervejas em latas. Para aqueles que ainda tem um certo preconceito com as latas, o que vocês podem complementar em relação a isso? Há algum problema em relação às latas como embalagem de cerveja? Quais os benefícios?
Pedro Butelli: A lata é a melhor forma de proteger a cerveja dos seus piores inimigos: oxigênio, calor e luz. Quanto mais exposta a cerveja estiver a esses elementos, mais distante ela vai ficar do que os cervejeiros idealizaram. Existe um certo “pé atrás” com as latas, como se as cervejas em lata fossem piores. Esse pensamento é justificável, mas não é porque as latas prejudicam as cervejas, muito pelo contrário. O que acontece na verdade é que as cervejarias que têm estrutura para enlatar em larga escala e vender para uma parcela maior do mercado (ou seja, justamente as cervejas que são vistas em lata pela maioria das pessoas) são as que produzem as cervejas que são vistas como de qualidade mais baixa hoje em dia. Então, a causalidade é reversa: não é a lata que faz as cervejas terem qualidade mais baixa, mas são as cervejas percebidas como sendo de qualidade mais baixa que são mais comumente vistas em latas. Com as artesanais aparecendo cada vez mais em latas, isso vai mudar.
Cerveja de Todos os Jeitos: Para finalizar, quais os próximos projetos da Hocus Pocus? Há alguma novidade que possa nos contar?
Pedro Butelli: Estamos quase terminando nossa fábrica em Três Rios, aqui no RJ. Teremos duas salas de brassagem: a principal, de 2500L, que fará todas as nossas cervejas, e uma pequena, de 200L, para fazermos experimentos em menor escala. Além disso, estamos montando nossa distribuição própria em São Paulo, então em breve vai ser muito mais fácil encontrar nossas cervejas por lá.
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