Já imaginou um sorvete de cerveja? Calma, a Eisbock não é bem isso, mas quase. Sua pronúncia é “ice-bock” e a tradução literal seria “Bock de gelo”, informações que explicam muito sobre esse estilo.
A Eisbock consiste basicamente numa Doppelbock que, depois de produzida, é congelada e filtrada. Com isso, o álcool, que possui ponto de congelamento em temperatura mais baixa, acaba sendo separado da água e de possíveis sedimentos.
O resultado é uma cerveja de perfil maltado, com dulçor bem aparente e muito alcoólica. Muito mesmo! Alguns dos rótulos dessa categoria perfilam entre as brejas com maior teor alcoólico do mundo.
Deliciosa punição
A origem da Eisbock não é documentada, então não podemos ter total convicção de como ela surgiu. Contudo, uma lenda é amplamente difundida entre os cervejeiros. Segundo essa história, o estilo surgiu por acaso nos anos 1890 na Alemanha, mais precisamente na cervejaria Reichelbräu (hoje chamada Kulmbacher), em Kulmbach.
O cervejeiro responsável da época teria pedido para que alguns barris de Bock recém-finalizados fossem movidos para o ambiente de maturação. O funcionário que recebeu a tarefa, já cansado após o longo dia de expediente, resolveu terminar o transporte no dia seguinte e teria deixado as barricas ao relento por toda a madrugada.
Era período do rigoroso inverno alemão, então você já pode pressupor o resultado. O líquido congelou quase que em sua totalidade, restando apenas um licor espesso e marrom no centro. No dia seguinte, ao descobrir o ocorrido, o cervejeiro chamou os responsáveis e aplicou a punição: beber o que havia restado nos barris.
Para a surpresa de todos, aquela se tornou uma deliciosa penitência! Tanto que os cervejeiros da região começaram a reproduzir o procedimento com Doppelbock, originando então essas deliciosas bebidas que chamamos hoje de Eisbock.
Álcool pra ninguém botar defeito
Tendo tudo isso em mente, não é difícil imaginar algumas das características da Eisbock. Ela é uma Lager de coloração cobre a marrom-escuro, tendo exemplares que trazem ainda reflexos rubí. Geralmente, são cervejas límpidas por passarem por longos períodos de maturação em baixas temperaturas — processo usado para “suavizar” a presença do álcool na bebida após a filtragem do líquido congelado.
No aroma, o estilo pede equilíbrio do malte com a presença do álcool e notas de frutas escuras, como uvas passas e ameixas. Os sabores têm como predominância os maltes, remetendo a nuances tostadas, de caramelo e, ocasionalmente, de chocolate. O amargor do lúpulo é quase inexistente, serve apenas para ajudar o álcool na compensação do dulçor potente promovido pelos grãos. A ideia é não deixar a cerveja enjoativa.
A baixa carbonatação combinada à alta presença do álcool proporciona uma consistência mais viscosa, lembrando licores. Se você balançar a taça em movimentos circulares (sutilmente pra não desperdiçar esses néctares, é claro), poderá perceber ainda a presença das chamadas “pernas” ou “lágrimas de álcool”, que nada mais são do que os rastros deixados por ele nas bordas do copo.
Resumidamente, o álcool numa Eisbock deve ser perceptível, mas suave. Sem queimar ou trazer sensações de solventes. Embora o Beer Judge Certification Program (BJCP) aponte que o estilo possui ABV de 9 a 14%, comercialmente não é difícil encontrar rótulos com mais de 20% — e o próprio BJCP cita a existência de exemplares com até 33% de teor alcoólico.
São cervejas que não possuem alta drinkability, e até nem devem ser consumidas em grandes quantidades. Uma garrafa é suficiente para você se deliciar com aromas e sabores potentes, além de ficar mais alegre do que de costume! Se tiver a oportunidade, não deixe de experimentar uma Eisbock.
Alguns exemplares de Eisbock:
Um dos mais tradicionais rótulos do estilo é o Kulmbacher Eisbock, produzido pela cervejaria, que a lenda referencia como criadora da categoria. É complicado de comprar ele no Brasil, mas outras opções tradicionais mais facilmente encontradas por aqui são a Schneider Aventinus Eisbock e a Southampton Eisbock.
Recentemente me deparei com a Freigeist Strawberry Eisbock Forever Vintage, uma Eisbock que leva morango na receita. Ainda não a degustei, mas estou bastante curioso pra descobrir o que essa combinação pode oferecer!
Vale mencionar que alguns desses rótulos estão disponíveis no Clube do Malte.