Paulo Feijão
Os estilos de cervejas que dominam, pelo menos em volume, no mundo hoje são da família Lager. E, voltando um pouco no tempo para falar sobre ela, você sabia que originalmente ela é uma cerveja que precisa fermentar por semanas ou até meses para desenvolver totalmente seu aroma e sabor? Nas últimas décadas as grandes cervejarias desenvolveram várias técnicas para encurtar este tempo de produção, buscando otimizar o processo sem perder qualidade.
As cervejas Lager tornaram-se dominante no final do século 19 com a invenção do resfriamento artificial, que permitiu aos cervejeiros produzirem esse estilo independentemente das condições externas. No berço desta família, a Alemanha, essas cervejas são principalmente do estilo Pilsener.
É comum encontrar que a existência da levedura Lager é baseada na invenção da tecnologia de resfriamento, mas isso é um mito. Antes disto, os alemães já faziam cervejas de baixa fermentação no inverno e cervejas de alta fermentação no verão. Apenas os cervejeiros que tinham acesso ao armazenamento naturalmente fresco, por exemplo, caves de pedra, foram capazes de fazer cerveja Lager também no verão.
Em uma visita a Nuremberg, fizemos um tour pelo bunker existente no subsolo da cidade, que durante a segunda guerra serviu para proteção contra os bombardeios, porém antes esse emaranhado de túneis serviam para produção de cerveja. Registros judiciais antigos da cidade, que datam do século 14, demonstravam a insatisfação dos cervejeiros “sem caves de pedra”, processando os cervejeiros “com caves de pedra” por venderem ilegalmente “Lager” no verão, pois havia uma lei municipal contra esse comércio, para evitar a competição desigual das cervejarias que tinham ou não cave. Essas históricas caves de rocha, que algumas cervejarias por lá ainda utilizam, geralmente têm temperaturas entre 7 ° e 10 ° C.
Resumindo, o controle de temperatura é fundamental, mas o fermento é o grande protagonista e tão importante que havia uma profissão própria para cuidar dele: The Hefner ou Häfner, talvez você já tenha ouvido falar do nome Hugh Hefner, o fundador da Playboy, ele é de ascendência alemã e muito provavelmente veio de uma família de artesãos que manuseavam fermento.
E por que estamos contando isso tudo sobre Lager?
Pois é a família do momento, é a “tendência” mais empolgante em cerveja artesanal que está acontecendo, muitos acreditam ser até mais que a turva Hazy IPA ou as “Pastrys”.
Desde que os imigrantes alemães vieram para o Brasil, as Lagers têm sido um elemento permanente de nossa cultura de bebida. Embora ao longo de muitos anos a receita mais incrementada, mais parruda, que estes imigrantes produziam, foi dando lugar a uma cerveja mais sensível, leve e de personalidade baixa. Embora uma cerveja boa ou ótima possa ser feita com milho e arroz, a produção em massa e o barateamento dos ingredientes trouxeram um gosto ruim na boca dos consumidores, o que infelizmente afastou alguns do nosso mercado por acreditarem que existia somente aquela cerveja.
Mas, devido ao paladar mais aguçado dos cervejeiros e fãs de cerveja, está se redescobrindo as clássicas Lagers. Timidamente a Pilsen Puro Malte foi abrindo espaço no paladar do grande consumidor, após isso tivemos um plus na lupulagem delas e vieram as Hop Lagers, que ainda estão sendo compreendidas pelo consumidor, mas o número de rótulos disponíveis está ajudando a desenvolver mais o paladar dos novos apreciadores. Hoje já é comum encontrar German Pils intensas, amargas e perfumadas.
Felizmente existem muito mais cores nesta paleta de cores, a Vienna ou Amber Lager tem seu espaço a um tempo no mercado nacional. As Dark Lager também estão no radar, com isso a Schwarzbier e Dunkel também estão despertando o paladar do consumidor. A Bock está voltando aos poucos para deixar o inverno menos intenso. Mas a surpresa deste ano foi o número de rótulos da clássica Doppelbock que foram lançados.
Mas, como somos um mercado inquieto, as variações e interpretações de estilo começam a aparecer, Italian Pils, Bock com cacau, Imperial Pils, Oat Lager, etc. A cerveja artesanal está recuperando aos poucos o que as cervejas Lagers sempre mereceram: respeito e reconhecimento. Acima de tudo, é importante inundarmos as torneiras com cerveja boa.
Um último fato interessante: a máquina de gelo de amônia foi inventada por Carl Von Linde, nascido na Francônia, na década de 1870 e foi apoiado por muitas cervejarias. Portanto, pode-se dizer que, sem a Alemanha e as cervejarias, não haveria geladeira em sua casa hoje.
Um brinde a cerveja devidamente gelada!
